quinta-feira, novembro 29, 2007

Alentejo

O peso morno do planalto muito seco depois da primeira tarde de calor a sério deste ano trouxe um cheiro a podridão. Perguntaste-me se sentia o cheiro, enquanto a pele do teu rosto se retorcia com repugnância. Dei a resposta que decorei há muito - Tenho pouco olfacto; é das alergias! - para me esquivar sempre a comentar odores, que, salvo ditosas excepções, me metem todos nojo. Seja de hálitos, perfumes ora demasiado olorosos, ora frugais em defeito, livros velhos ou novos, restaurantes e fumos, transpirações ou desodorizantes, raro é o que me convida a encher o peito de ar, por força de desejar intensificar a passagem das nanocoisinhas pelas ventas.

Senti, mais cedo que tu até, o cheiro a cadáveres de cães (só não quis falar sobre isso). Não posso pensá-lo no singular, o cheiro era tão intenso, ademais adensando-se, que era impossível não imaginar uma matilha inteira atropleada por carros, mas um de cada vez, cosendo a carne lentamente entre pneumáticos, asfalto e o sol inteiro, há alguns dias.

Só que não eram cães, nem vinha da estrada.


Martinho